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O clamor dos que sofrem

  • Foto do escritor: A Voz Regional
    A Voz Regional
  • 7 de nov. de 2016
  • 2 min de leitura

A parábola da viúva e do juiz sem escrúpulos é, como tantos outros, um relato aberto que pode suscitar nos ouvintes diferentes ressonâncias. Segundo Lucas, é um chamado a orar sem desanimar-se, porém é também um convite a confiar que Deus fará justiça a quem lhe grita dia e noite. Que ressonância pode ter hoje em nós este relato dramático que nos recorda tantas vítimas abandonadas injustamente à sua própria sorte? Na tradição bíblica, a viúva é símbolo por excelência da pessoa que vive sozinha e desamparada. Esta mulher não tem marido nem filhos que a defendam. Não conta com apoios nem recomendações. Somente tem adversários que abusam dela, e um juiz sem religião nem consciência ao qual não importa o sofrimento de ninguém. Aquilo que a mulher pede não é um capricho. Somente reclama justiça. Este é o seu protesto repetido com firmeza diante do juiz: «Faze-me justiça». Sua petição é a de todos os oprimidos injustamente. Um grito que está na linha do que dizia Jesus aos seus: «Buscai o Reino de Deus e sua Justiça». É certo que Deus tem a última palavra e fará justiça àqueles que gritam dia e noite. Esta é a esperança que Cristo ascendeu em nós, ressuscitado pelo Pai de uma morte injusta. Porém, enquanto não chega essa hora, o clamor daqueles que vivem gritando sem que ninguém escute os seus gritos, não cessa. Para uma grande maioria da humanidade, a vida é uma interminável noite de espera. As religiões pregam salvação. O cristianismo proclama a vitória do Amor de Deus encarnado em Jesus crucificado. Entretanto, milhões de seres humanos só experimentam a dureza de seus irmãos e o silêncio de Deus. E, muitas vezes, somos os mesmos crentes que ocultamos seu rosto de Pai encobrindo-o com nosso egoísmo religioso.

Por que nossa comunicação com Deus não nos faz escutar, finalmente, o clamor dos que sofrem injustamente e nos gritam de mil formas: «Faze-nos justiça»? Se, ao orar, nos encontramos de verdade com Deus, como não somos capazes de escutar com mais força as exigências de justiça que chegam até seu coração de Pai? A parábola interpela a todos nós crentes. Continuamos alimentando nossas devoções pessoais esquecendo aqueles que vivem sofrendo? Continuaremos orando a Deus para colocá-lo a serviço de nossos interesses, sem que nos importem muito as injustiças que há no mundo? E se orar fosse precisamente esquecer-nos de nós e buscar com Deus um mundo mais justo para todos? ( José Antonio Pagola, sacerdote, biblista e escritor espanhol)

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